A empresa voltada para processos
Michael Hammer HSM Management
Michael Hammer descreve como deve ser a organização
do século XXI.
Se a reengenharia está caindo de moda, um novo conceito
gerencial atrelado a ela vem subindo muito e com força:
a organização orientada para processos. Quem lança
esse novo paradigma empresarial é ninguém menos do
que o "pai da reengenharia" Michael Hammer,
para quem esse tipo de empresa é descendente direto
da reengenharia. Ele tem a seu lado exemplos de companhias
que vêm adotando o novo modelo com sucesso, como IBM
e Texas Instruments, entre as mais conhecidas. Em
entrevista exclusiva a HSM Management, Hammer explica
o que é processo, o que é a nova organização e o papel
de executivos e demais funcionários dentro dela, entre
outros assuntos. Uma organização voltada para processos,
diz o especialista, projeta e mensura cuidadosamente
seus processos. Além disso, faz com que todos os funcionários
os entendam e se responsabilizem por eles, criando
o que Hammer chama de "propriedade de processo".
Segundo Hammer, o novo tipo de organização é capaz
de acabar com alguns dogmas do mundo da administração,
alterando, por exemplo, o status do profissional de
linha de frente. A entrevista é de Mercedes Reincke.
O que significa ser uma organização
orientada para processos, como o sr. costuma dizer?
Esse é um novo paradigma?
Certamente esse é um novo paradigma para as empresas.
Uma organização orientada para processos tem neles
o centro das atenções. Nas organizações tradicionais,
os processos são ignorados. Em uma organização orientada
para processos eles são cuidadosamente projetados,
mensurados e, o que é mais importante, todos os entendem.
Dentro desse modelo, os processos funcionam bem e
trazem bons resultados para a empresa.
Seu último livro, Além da
Reengenharia, não fala exatamente da reengenharia,
mas de suas conseqüências. O sr. pode detalhá-las?
Talvez a principal conseqüência da reengenharia seja
o surgimento da organização orientada para processos,
da qual acabamos de falar. A reengenharia começou
como um projeto para melhorar o desempenho organizacional,
mas o que ela realmente criou foi um paradigma totalmente
novo de organização. É novo porque baseado em um princípio
diferente daquele das organizações tradicionais.
E você me perguntará: qual é o princípio das organizações
tradicionais? Elas se baseiam no fato de que os funcionários
têm foco restrito, e a visão mais geral do quadro
cabe unicamente aos gerentes. Na organização voltada
para processos, todos têm um visão ampla. O que eu
costumo dizer é: "As pessoas têm de cumprir tarefas,
mas pensar a respeito de processos". É o oposto
do que ocorreu na Revolução Industrial, que pregava
"especialize-se e concentre-se". As organizações
orientadas para processos dizem "veja o quadro
maior e tenha um foco mais amplo".
A idéia central de um processo é a reunião de tarefas
ou atividades isoladas. Se você pensar no preenchimento
de um pedido, uma pessoa estaria dedicada ao gerenciamento
do estoque, outra pessoa faria a expedição e uma terceira
estaria engajada na obtenção do pedido do cliente.
Normalmente ninguém pensa como essas partes se juntam,
criando um processo que dê resultados - resultados
esses que cheguem até os clientes. Por isso, na organização
de processos as pessoas têm papéis maiores e mais
amplos.
Nas organizações tradicionais, o funcionário realiza
uma tarefa comandado por seu chefe. Nas empresas voltadas
para processos, o funcionário também trabalha com
outras pessoas, mas não seguindo ordens e sim em um
espírito de equipe, com o propósito de alcançar determinados
resultados e objetivos definidos pelos clientes.
Então, o que deve fazer uma
empresa para enfrentar a transição, ou seja, para
deixar de ser tradicional e se transformar em uma
organização orientada para processos?
Para trabalhar dessa maneira, a empresa precisa principalmente
de duas coisas. Em primeiro lugar, um comprometimento
sério dos altos executivos com a parte que lhes cabe
sem isso nada acontece. Feito isso, o passo seguinte
é identificar os processos e colocar as chefias como
responsáveis por eles. Isso difere daquelas organizações
onde ninguém nunca tem responsabilidade pelo processo
em questão e portanto nunca há ninguém para estimular
os esforços.
O novo ,jeito de administrar que se relaciona com
essa responsabilidade é chamado de "propriedade
de processos" (process ownership, em inglês).
Na transição para esse tipo de gerenciamento, é muito
importante o papel dos funcionários da linha de frente.
Como é essa transição para
os membros da organização?
Na verdade, é uma mudança muito difícil, porque as
pessoas têm de aprender a pensar de novas formas.
Têm de aprender a compreender o negócio, a assumir
mais responsabilidades, a trabalhar em equipe. E essa
adaptação está longe de ser fácil.
O Sr. acredita que os executivos,
os chefes, terão dificuldade em mudar sua forma de
pensar e trabalhar de acordo com o novo modelo?
Para alguns a transição será muito difícil; para outros,
não. Há os executivos receptivos à mudança e há os
que acham simplesmente impossível fazê-la. Estes têm
duas escolhas: sair da empresa ou voltar para um cargo
da linha de frente - e é isso que a maior parte deles
faz. O que, aliás, não é nenhum demérito, pois a linha
de frente é muito importante na nova organização voltada
para processos, tão importante quanto os executivos.
A linha de frente na empresa orientada para processos
é aquela que toma as decisões e assume a responsabilidade.
Em uma empresa tradicional, a chefia interpreta esse
papel, mas isso significa atrasos e muitos outros
problemas. Em uma organização de processos existe
menos chefia e muito mais responsabilidade da linha
de frente.
O sr. não acha que os executivos
podem relutar em voltar a ser da linha de frente porque
isso significaria uma perda de status?
Sim, é possível. Uma das coisas que as empresas têm
de fazer é mudar esse status social subliminar e passar
a mensagem de que ser chefe não é a única maneira
de obter sucesso. Se eu acho que os executivos vão
resistir? Sim, alguns deles vão, mas eu acho que,
quando compreenderem que não há outra escolha, eles
poderão ultrapassar essa relutância. Uma das tarefas
da liderança executiva é fazer com que as pessoas
entendam que não há outra escolha e que isso tem de
acontecer.
Em sua opinião, qual é exatamente
a importância desse novo paradigma?
Estou convencido de que essa é a única maneira de
conseguirmos os avanços que a economia globalizada
de hoje exige.
O Sr. pode dar exemplos de
empresas que estejam aplicando esse novo paradigma
com sucesso?
Muitas das melhores empresas que eu conheço estão
fazendo isso de maneira bastante ostensiva para ter
sucesso em setores econômicos muito difíceis e concorridos.
Um exemplo é a Motorola; outro é a Texas Instruments.
A IBM, por exemplo, está se concentrando muito em
seus processos, e esse tem sido um dos principais
ingredientes de seu sucesso recente.
O Sr. acha que o renascimento
da IBM se deve à sua localização nos processos?
Certamente esse é um dos aspectos mais importantes
de sua recuperação. Não digo que seja o único, mas
é um dos principais. E existem muitas outras empresas
destacadas fazendo isso. Uma delas, sobre a qual eu
falo em meu livro, é a American Standard. Ela é menor
do que a IBM; atua em todo o mundo nos segmentos de
aparelhos de ar condicionado, encanamentos e freios
para caminhões e está fazendo isso com bastante seriedade.
Em seu livro, o sr. afirma
que esse enfoque gera novas oportunidades de trabalho.
Como isso acontece?
Nós vemos que as organizações orientadas para processos
são aquelas que deixam os clientes mais satisfeitos
e, consequentemente, crescem mais. Crescimento significa
novos empregos. Portanto, não estamos falando em redução
de empregos, mas de aumento, embora os novos empregos
sejam diferentes, de outros tipos. O crescimento é
a maneira de obter sucesso.
Em meu livro menciono o caso de empresas como a Eastern
Airlines, que por continuarem a fazer negócios da
maneira antiga, saíram do mercado e não existem mais.
Empresas desse gênero não têm futuro, porque os concorrentes
já estão fazendo as coisas de um modo diferente.
Como o cliente se beneficia
dos resultados do novo modelo?
O cliente está no centro dessa nova organização de
processos. O objetivo total desse trabalho é oferecer
para o cliente mais valor, de forma mais rápida e
a um custo mais baixo. Nossas organizações atuais
são um entrave para isso. Ao optar pelo paradigma
de processos podemos fazer as coisas de forma muito
melhor para o cliente.
Qual é a "alma"
da nova empresa orientada para processos?
É realmente o trabalho em equipe, a cooperação, a
responsabilidade individual e a vontade de fazer um
trabalho melhor. De muitas maneiras, essa é uma organização
idealista. Seus resultados financeiros são a conseqüência,
mas a proposta não é fazer dinheiro simplesmente -
é criar mais valor e fazer um trabalho melhor.
Que características marcam
uma empresa de sucesso de forma geral?
Em minha opinião, a chave do reconhecimento do sucesso
de uma empresa é, provavelmente mais do que qualquer
outra coisa, a medida de quanto esse tipo de cultura
está introjetado na organização. Os CEOs vêm e vão,
mas, se se tem uma cultura que valoriza as coisas
sobre as quais falamos, esse tipo de empresa sempre
encontrará uma maneira de ter sucesso.
Se é como o sr. diz -"os
CEOs vêm e vão"-, qual é a importância dos presidentes
na organização?
O papel do CEO ou presidente é realmente o de criar
a cultura desejável, abrir o caminho e garantir sua
continuidade. Se ele fizer isso, a organização terá
sucesso, mesmo depois que ele for embora.